O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu apertar o cerco e pediu explicações ao governo federal sobre o contrato de R$ 478,3 milhões fechado sem licitação com a Organização de Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI) para a organização da COP30. A área técnica do tribunal viu possíveis irregularidades e quer detalhes sobre os critérios da contratação.
O caso veio à tona em fevereiro, revelado pela CNN. A Secretaria Extraordinária para a COP30, ligada à Casa Civil, assinou o contrato com a OEI sem concorrência pública. Só no segundo semestre de 2024, a entidade firmou cinco acordos com o governo Lula, somando R$ 600 milhões — um salto vertiginoso em relação aos R$ 50 milhões acumulados ao longo de todos os governos anteriores.
Em um documento de oito páginas, datado de 18 de março, o TCU cobra transparência sobre os valores e quer saber se houve algum tipo de análise comparativa com preços de mercado. “A falta de informações sobre os critérios que embasaram o valor contratado, aliada à magnitude financeira envolvida, reforça a necessidade de diligência à Unidade Jurisdicionada, para que sejam apresentados esclarecimentos detalhados sobre a composição do valor estimado de R$ 478,3 milhões”, diz o texto.
A CNN procurou a Secretaria da COP, mas ainda não obteve resposta.
Modelo brasileiro na contramão
O documento também aponta que a escolha do Brasil para a organização da COP30 foge do padrão adotado em outras edições do evento. Em vez de concorrência aberta e parcerias privadas, como ocorreu na COP26 (Reino Unido, 2021) e na COP27 (Egito, 2022), o governo federal optou por um contrato direto, sem licitação.
“A representação destaca uma discrepância significativa na abordagem adotada pelo Brasil para a organização da COP30 […] em detrimento de alternativas que priorizem a concorrência e a participação do setor privado, como observado nas COPs anteriores”, ressalta o texto.
O TCU também quer explicações sobre a escolha da OEI, já que há outros organismos internacionais atuando no Brasil. “Tendo em vista que não houve o procedimento competitivo, isto é, a escolha da entidade foi realizada de maneira discricionária pelo órgão […], também deve ser questionado na diligência quais foram os critérios e justificativas da escolha da entidade pela Unidade Jurisdicionada”, aponta o tribunal.
Pagamentos antecipados?
Outro ponto que levantou suspeitas é a possibilidade de pagamentos antecipados à OEI, antes mesmo da formalização do contrato. Registros do Portal da Transparência indicam repasses de R$ 5 milhões em 26 de agosto de 2024 e R$ 15,7 milhões em 23 de dezembro de 2024, totalizando R$ 20,7 milhões antes da assinatura oficial, que ocorreu apenas em 18 de dezembro de 2024.
O tribunal alerta que a situação pode comprometer a legalidade do processo. “Esses valores sugerem a possibilidade de execução antecipada do objeto do contrato antes de sua formalização ou a existência de outro instrumento contratual não declarado, o que compromete a legalidade e a transparência do processo”, aponta o relatório.
Má gestão e influência indevida
A Corte de Contas não descarta um problema ainda maior: a possibilidade de má gestão de recursos públicos. O documento cita a ausência de justificativas econômicas para a contratação e alerta para um possível desrespeito a princípios constitucionais de eficiência e economicidade.
“A representação destaca ainda a ausência de elementos que demonstrem a adequação econômica da contratação, o que pode sugerir, em tese, uma possível má gestão dos recursos públicos”, diz o texto.
Além disso, o tribunal chama atenção para o crescimento repentino dos contratos do governo Lula com a OEI, que dispararam após a nomeação de Leonardo Barchini como secretário-executivo do Ministério da Educação. Antes disso, ele comandava a própria OEI no Brasil.
Nos bastidores, a pressão do TCU sobre o governo federal vem aumentando. O tribunal quer respostas — e rápido.
Fonte CNNBrasil